OAB Subseção STM

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Pensão alimentícia

A pensão alimentícia ficará mais rigorosa a partir de março
1) As consequências para o devedor de alimentos no Novo CPC

Tendo em vista as especificidades do crédito alimentar (sobrevivência do alimentando e dever de prover do alimentante) existe, como é notório, a previsão de prisão civil do devedor de alimentos, no caso de “inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentar” (CF, art. 5º, LXVII3).

O objetivo não é a prisão em si, mas sim compelir o devedor a que arque com o débito alimentar. Essa forma coercitiva é tratada, no âmbito do CPC/73, no art. 733, especificamente no § 1º:

§ 1º Se o devedor não pagar, nem se escusar, o juiz decretar-lhe-á a prisão pelo prazo de 1 (um) a 3 (três) meses.

Apesar da omissão do texto legislativo, essa prisão é cumprida em regime fechado.

Durante a tramitação do NCPC no Congresso Nacional, muito se debateu se o regime fechado seria o melhor meio para se lograr o cumprimento do crédito alimentar. Cogitou-se se melhor não seria fazer com que o devedor de alimentos trabalhasse durante o dia (para, exatamente, obter recursos capazes de permitir o adimplemento do débito alimentar), com o recolhimento à prisão apenas durante a noite. Essa proposta, aliás, constou de versões preliminares do projeto de novo Código. Nessa perspectiva, o relatório do Deputado Sérgio Barradas trazia a seguinte previsão [4]:

A prisão será cumprida em regime semiaberto; em caso de novo aprisionamento, o regime será o fechado.

Ou seja: chegou o NCPC a prever a prisão pelo regime fechado apenas no caso de reiteração de prisão.

Porém, a inovação não foi bem recebida por muitos setores [5] e, ainda na Câmara dos Deputados, foi alterada a previsão legislativa, de modo a constar expressamente a prisão civil do devedor de alimentos em regime fechado.

O texto sancionado (L. 13.105/15) regula o assunto no art. 528, e tem a seguinte redação:

§ 4º A prisão será cumprida em regime fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns.

E, tal qual no Código anterior, a prisão não afasta o débito, conforme prevê o mesmo artigo:

§ 5º O cumprimento da pena não exime o executado do pagamento das prestações vencidas e vincendas.

Além disso, foi inserido no Código o que já constava da Súmula 309/STJ, no sentido de somente ser possível a prisão civil em relação às últimas três parcelas devidas. A previsão, novamente, está no art. 528:

§ 7º O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até as 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.

Portanto, em relação à prisão civil do devedor, nada mudou no Novo CPC.

Apesar disso, há inovações no tocante ao objetivo de se buscar maior efetividade no cumprimento da obrigação alimentar.

De um lado, determina o Novo CPC, no caso de inadimplemento, o protesto da decisão não adimplida de alimentos:

Art. 528, § 1º Caso o executado, no prazo referido no caput, não efetue o pagamento, não prove que o efetuou ou não apresente justificativa da impossibilidade de efetuá-lo, o juiz mandará protestar o pronunciamento judicial, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 517.

Ou seja, antes mesmo da prisão civil, sejam alimentos fixados de forma definitiva ou alimentos provisórios [6], o juiz determinará o protesto da decisão que fixou os alimentos

Trata-se de novo mecanismo coercitivo, pois o protesto (e consequente “nome sujo” no mercado) pode trazer problemas na vida cotidiana do devedor de alimentos.

Em um país onde as pessoas, de modo geral, realizam muitas compras a crédito (o que depende de “nome limpo”), trata-se de bem-vinda alteração legislativa – que, aliás, poderá ser utilizada em relação a qualquer decisão judicial condenatória [7].

Mas vale destacar distinções entre o protesto da decisão de alimentos e das demais: (i) nas outras decisões condenatórias, há necessidade de trânsito em julgado; nas decisões de alimentos, não – especialmente para a situação dos alimentos provisórios – e (ii) nas demais decisões condenatórias, o protesto é feito a requerimento da parte; no caso dos alimentos, é de ofício determinado pelo juiz.

Além disso, há outra inovação interessante: a possibilidade de desconto dos vencimentos do devedor (no caso, por óbvio, de devedor assalariado ou que receba aposentadoria ou pensão) em até 50% de seus vencimentos líquidos.

Art. 529, § 3º Sem prejuízo do pagamento dos alimentos vincendos, o débito objeto de execução pode ser descontado dos rendimentos ou rendas do executado, de forma parcelada, nos termos do caput deste artigo, contanto que, somado à parcela devida, não ultrapasse cinquenta por cento de seus ganhos líquidos.

Assim, se um devedor de alimentos passa a receber salário, poderá haver, além do desconto em folha das parcelas mensais, um desconto adicional em relação às parcelas devidas. Pensando na situação mais usual, um devedor que tenha de pagar 30% de seus vencimentos mensalmente (quanto à parcela mensal, os alimentos vincendos), poderá ter mais 20% de desconto para o pagamento parcelado dos alimentos vencidos.

Portanto, em síntese, o Novo CPC prevê o seguinte em relação ao inadimplemento de débito alimentar:

(i) protesto da decisão judicial;

(ii) prisão civil, em regime fechado;

(iii) possibilidade de desconto de até 50% dos vencimentos líquidos, no caso de execução de assalariado ou aposentado.

2) Procedimento (s) no caso de inadimplemento da obrigação alimentar

Inova o Novo CPC em relação ao trâmite da execução de alimentos.

No CPC/73, há um duplo regime: execução pelo art. 732 (sob pena de penhora) ou execução pelo art. 733 (sob pena de prisão).

Com a Lei 11.232/05 (que criou a fase de cumprimento de sentença), o sistema acabou por ficar incongruente. Isso porque o legislador reformista simplesmente ignorou o dever de prestar alimentos quando da edição dessa lei [8].

Mas, de forma sintética, após debates doutrinários e divergência jurisprudencial, prevaleceu no STJ a seguinte posição9: os alimentos previstos em sentença são pleiteados de duas formas distintas: (a) execução autônoma para as hipóteses do art. 733 e (b) cumprimento de sentença para a hipótese do art. 732 (CPC, art. 475-I e ss.).

Diferentemente do que ocorreu na reforma de 2005, o legislador do Novo CPC não negligenciou o dever de prestar alimentos. Ao contrário, trouxe uma série de inovações.

Assim, agora há quatro possibilidades para se executar os alimentos devidos. A distinção se em relação ao tipo de título (judicial ou extrajudicial) e tempo de débito (pretérito ou recente):

(i) cumprimento de sentença, sob pena de prisão (arts. 528/533);

(ii) cumprimento de sentença, sob pena de penhora (art. 528, § 8º);

(iii) execução de alimentos, fundada em título executivo extrajudicial, sob pena de prisão (arts. 911/912);

(iv) execução de alimentos, fundada em título executivo extrajudicial sob pena de penhora (art. 913).

Como se percebe, há importantes inovações:

a criação do cumprimento de sentença sob pena de prisão;
o fim da necessidade de citação do executado para a prisão da sentença de alimentos;
a previsão expressa de cumprimento de sentença sob pena de penhora (já utilizada no CPC/73, mas sem previsão legal) e
a criação da execução de alimentos fundada em título executivo extrajudicial (sob pena de prisão ou sob pena de penhora – conforme tratar-se de débito recente ou débito pretérito), o que afasta as dúvidas quanto à possibilidade de fixação de alimentos e prisão civil decorrentes de acordo extrajudicial (especialmente, mas não só, via escritura pública).
O assunto débito alimentar recebeu atenção do legislador e está bem regulado. Assim, é possível acreditar que o acesso à Justiça do credor de alimentos seja menos árido e árduo do que hoje é.

Contudo, ainda que o sistema esteja melhor, é certo que, infelizmente, não se obterá a plena efetividade das decisões judiciais alimentícias. Isso porque a questão envolvendo os alimentos é um problema mais social e de respeito ao próximo do que efetivamente jurídico.

Do julgamento antecipado parcial de mérito (art. 356 do Novo CPC) e sua aplicação às ações de Direito de Família

Flávio Tartuce[1]

O Novo Código de Processo Civil, que entrará em vigor em 18 de março de 2016 – na visão deste autor, seguindo-se o mesmo critério adotado anteriormente para o Código Civil de 2002 –, traz muitas normas com impacto direto sobre o Direito de Família Brasileiro. Cite, como principal exemplo, as regras procedimentais específicas para as Ações de Família, previstas entre os seus arts. 693 a 699, com destaque para a prioridade que deve ser dada à mediação e à conciliação entre as partes.

Ademais, existem outros preceitos, muitos deles escondidos, ou não perceptíveis em uma primeira análise, com repercussões para esse importante ramo do Direito Civil, o que deve ser esmiuçado pela doutrina e incrementado pela jurisprudência nos próximos anos.

Um desses comandos é aquele que trata do julgamento antecipado parcial de mérito, o que tem enorme incidência para as demandas que almejam o fim da conjugalidade, pelo divórcio, e a dissolução da união estável. Conforme o art. 356 do CPC/2015, passa a ser possível, expressamente pelo texto legal, uma decisão parcial, quando um ou mais dos pedidos formulados ou parcela deles: a) mostrar-se incontroverso; e b) estiver em condições de imediato julgamento, por não haver a necessidade de produção de provas ou por ter ocorrido à revelia.

Sendo assim, partindo para a prática familiarista, em havendo pedido de divórcio ou de dissolução da união estável de ambos os cônjuges ou companheiros, cumulado com outras pretensões –, caso da guarda de filhos, dos alimentos e de eventual pedido de responsabilização da outra parte –, é perfeitamente possível que o juiz da causa decrete a dissolução do casamento ou da união estável, seguindo a ação no debate de outras questões que ainda pendem de julgamento.

Na verdade, tal solução já vinha sendo adotada pela jurisprudência, em especial pelo Desembargador Caetano Lagrasta Neto, ora aposentado, em julgamentos perante o Tribunal de Justiça de São Paulo, seguindo-se a tese dos capítulos de sentença, desenvolvida por Cândido Rangel Dinamarco. Entre muitos arestos, conforme acórdão da 8.ª Câmara de Direito Privado da Corte Bandeirante, proferido no Agravo de Instrumento 990.10.357301-3, em 12 de novembro de 2010, de sua relatoria, “com a promulgação da Emenda Constitucional n. 66/2010, e a nova redação do § 6.º do art. 226 da CF, o instituto da separação judicial não foi recepcionado, mesmo porque não há direito adquirido a instituto jurídico. A referida norma é de aplicabilidade imediata e não impõe condições ao reconhecimento do pedido de divórcio, sejam de natureza subjetiva – relegadas para eventual fase posterior à discussão sobre culpa – ou objetivas – transcurso do tempo. (...). Discussões restantes: nome, alimentos, guarda e visitas aos filhos, bem como a patrimonial, devem ser resolvidas, conforme ensinamentos de Cândido Rangel Dinamarco, em ‘cisão da sentença em partes, ou capítulos, em vista da utilidade que o estudioso tenha em mente. É lícito: a) fazer somente a repartição dos preceitos contidos no decisório, referentes às diversas pretensões que compõem o mérito; b) separar, sempre no âmbito do decisório sentencial, capítulos referentes aos pressupostos de admissibilidade do julgamento do mérito e capítulos que contêm esse próprio julgamento; c) isolar capítulos segundo os diversos fundamentos da decisão’ (Capítulos de Sentença. 4ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, p. 12). Observa-se que solução diversa não preservaria a força normativa da Constituição e a carga axiológica decorrente da normatização dos princípios da dignidade humana e liberdade na busca do amor e da felicidade”.

No âmbito da doutrina, esse mesmo caminho foi adotado, pelo menos parcialmente, em enunciado aprovado na VIII Jornada de Direito Civil, evento promovido pelo Conselho da Justiça Federal em setembro de 2015, segundo o qual: “transitada em julgado a decisão concessiva do divórcio, a expedição de mandado de averbação independe do julgamento da ação originária em que persista a discussão dos aspectos decorrentes da dissolução do casamento” (Enunciado n. 602). Em suma, o casal tem o seu vínculo extinto, sem prejuízo da resolução de todos os dilemas que ainda pendem de decisão perante o Poder Judiciário.

No mesmo sentido, mas com tom bem mais abrangente, o Enunciado n. 18 do IBDFAM, aprovado no seu X Congresso Brasileiro, em outubro do mesmo ano, conforme proposta formulada por este autor: “nas ações de divórcio e de dissolução da união estável, a regra deve ser o julgamento parcial do mérito (art. 356 do Novo CPC), para que seja decretado o fim da conjugalidade, seguindo a demanda com a discussão de outros temas”.

Em verdade, acreditamos que, em tal aspecto, o Novo Código de Processo Civil dialoga perfeitamente com a Emenda Constitucional n. 66/2010, que suprimiu os prazos para o divórcio e a separação de direito, alterando o art. 226, § 6.º, do Texto Maior e facilitando a dissolução do vínculo conjugal. Esse diálogo é perfeitamente notado pelo fato de o Estatuto Processual emergente afastar qualquer burocracia ou entrave maior para o fim do casamento. Efetiva-se, assim, o teor do que consta do próprio art. 8.º do mesmo Codex, in verbis: “ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência”.

Não restam dúvidas de que a eficiência e a economia estão muito prestigiadas com tal premissa. A título de exemplo mais específico, e com o intuito de esclarecer, em havendo pedido de divórcio cumulado com alimentos, o juiz pode deferir o divórcio por sentença, liberando definitivamente as partes daquele indesejado vínculo, e seguir no curso da lide a discussão a respeito dos alimentos. Tal opção não afasta a possibilidade de as partes ingressarem com duas ações autônomas, quais sejam uma de divórcio e outra de alimentos, o que depende de sua pretensão. De toda sorte, não resta dúvida de que o primeiro caminho melhor concretiza o que consta como regramento fundamental da própria norma processual.

Feitos tais esclarecimentos, acrescente-se que, de acordo com a mesma norma em estudo, a decisão que julgar parcialmente o mérito poderá reconhecer a existência de obrigação líquida – certa quanto à existência e determinada quanto ao valor –, ou mesmo ilíquida – que não preenche tais requisitos (art. 356, § 1.º, do CPC/2015). Eventualmente, não havendo dissenso ou pendência entre as partes, a sentença que decreta o fim da união pode também trazer em seu bojo a fixação de verba alimentar. A parte poderá liquidar ou executar, desde logo, essa obrigação reconhecida na decisão que julgar parcialmente o mérito, independentemente de caução ou garantia, ainda que haja recurso contra essa interposto (art. 356, § 2.º, do CPC/2015).

Na hipótese dessa execução, se houver trânsito em julgado da decisão, a execução será definitiva (art. 356, § 3.º, do CPC/2015). Em complemento, a liquidação e o cumprimento da decisão que julgar parcialmente o mérito poderão ser processados em autos suplementares, a requerimento da parte ou a critério do juiz (art. 356, § 4.º, do CPC/2015).

Por fim, está previsto na norma emergente que a decisão proferida com base neste artigo é impugnável por agravo de instrumento (art. 356, § 5.º, do CPC/2015). No campo processual, anote-se que essa já era a posição da doutrina especializada, especialmente no tocante às Ações de Família (por todos: TARTUCE, Fernanda. Processo civil aplicado ao direito de família. São Paulo: GEN/Método, 2012, p. 253).

Como palavras finais, entre perdas e ganhos, no objeto de estudo aqui abordado, o Novo Código de Processo Civil é elogiável, resolvendo definitivamente dilema que há muito tempo incomodava os teóricos e práticos do Direito de Família Brasileiro. Esperamos que a jurisprudência incremente essa solução nos próximos anos.

[1] Doutor em Direito Civil pela USP. Professor do programa de mestrado e doutorado da FADISP – Faculdade Especializada em Direito. Professor dos cursos de graduação e pós-graduação lato sensu em Direito Privado da EPD – Escola Paulista de Direito, sendo coordenador dos últimos. Professor da Rede LFG. Diretor nacional e estadual do IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família. Advogado e consultor jurídico em São Paulo.

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