O dano moral da pessoa jurídica:
O dano moral surgiu como um instituto jurídico típico do
direito civil e que, com o passar tempo, foi assumindo papel de destaque também
em outras áreas do direito. Comprovação disso, no campo jus trabalhista, é a
quantidade de pleitos judiciais, artigos acadêmicos e discussões públicas
envolvendo o dano moral na relação de trabalho.
O objetivo do presente artigo é analisar um tema polêmico e
de grande importância atualmente: a aplicabilidade do dano moral às pessoas
jurídicas. Contudo, antes de examinar essa evolução particular desse instituto,
é conveniente compreender suas origens e definições no que concerne à pessoa
natural.
De acordo com as definições mais consagradas na doutrina e
na jurisprudência, o dano moral é uma lesão que afeta um bem jurídico na esfera
dos direitos de personalidade. Segundo Maria Helena Diniz (Revista Literária de
Direito, Janeiro/fevereiro de 1996, Ano II, n.9, pág. 8), dano moral é a lesão
a interesses não patrimoniais de pessoa física ou jurídica provocada pelo fato
lesivo, lembrando, com Zannoni, que "o dano moral não é a dor, a angústia,
o desgosto, a aflição espiritual, a humilhação, o complexo que sofre a vítima
do evento danoso, pois esses estados do espírito constituem a consequência do
dano".
Sobre as consequências do dano, em termos estritamente
jurídicos, para a configuração da responsabilidade civil extracontratual, é
imprescindível a ocorrência dos seguintes fatores: ato ilícito praticado por
ação ou omissão; culpa do seu agente, no conceito genérico (elemento
subjetivo); dano material ou moral do ofendido (elemento objetivo). Assim, o direito
à indenização por lesão moral decorrente de ato ilícito exige prova do dano
efetivo, ação culposa e nexo de causalidade, conforme o artigo 186 do CC.
A extensão da construção doutrinária mais geral do dano
moral às pessoas jurídicas demanda certas reservas e adequações, especialmente
pela diferença existente entre as situações. Na pessoa natural, é muito mais
fácil perceber e estimar a ocorrência do dano moral, algo que nas pessoas
jurídicas torna-se mais complexo.
Daí a observação do civilista Sílvio de Salvo Venosa segundo
a qual "em se tratando de pessoa jurídica, o dano moral de que é vítima
atinge seu nome e tradição de mercado e terá sempre repercussão econômica,
ainda que indireta. De qualquer forma, a reparabilidade do dano moral causado à
pessoa jurídica ainda sofre certas restrições na doutrina e na jurisprudência,
principalmente por parte dos que defendem que a personalidade é bem
personalíssimo, exclusivo da pessoa natural. Para essa posição, seus defensores
levam em consideração que dano moral denota dor e sofrimento, que são
exclusivos do Homem. Não são, entretanto, somente dor e sofrimento que traduzem
o dano moral, mas, de forma ampla, um desconforto extraordinário na conduta do
ofendido e, sob esse aspecto, a vítima pode ser tanto a pessoa natural como a
pessoa jurídica" (Direito Civil - Responsabilidade Civil. 3. ed. São
Paulo: Atlas 2003 - p. 203).
Desse modo, as dificuldades de conceitualização não tem o
condão de afastar essa proteção das pessoas jurídicas. Isso porque o dano moral
da pessoa jurídica está muito mais associado a esse "desconforto
extraordinário" que afeta o nome e a tradição de mercado, com repercussão
econômica, do que aos atributos das pessoas naturais.
Na jurisprudência, há diversos precedentes que admitem a
configuração do dano moral às pessoas jurídicas:
DANO MORAL – HONRA – CONCEITO – INDENIZAÇÃO RECLAMADA POR
PESSOA JURÍDICA – 1. Entende-se como honra também os valores morais,
relacionados com a reputação, o bom nome ou o crédito, valores estes
inteiramente aplicáveis às pessoas jurídicas; não apenas aqueles que afetam a
alma e o sentimento do indivíduo, valores próprios do ser humano. 2. A ofensa à
empresa tanto pode causar-lhe prejuízo de ordem material quanto de ordem apenas
moral, devendo recompor-se o seu patrimônio dessa natureza atingido.
Irrelevante que o reflexo não seja íntimo, psíquico ou espiritual, pois que a
tanto não se limita o conceito a extrair-se do vocábulo "honra". O
uso indevido do nome da empresa configura violação à imagem e valores sociais
da ofendida no meio comercial, prejudicando as atividades e acarretando
descrédito frente aos membros de determinada comunidade. 3. A pessoa jurídica
pode reclamar indenização por dano moral, desde que violados quaisquer dos
direitos pela mesma titulados e previstos no inciso X do artigo 5º da
Constituição Federal, porquanto o legislador não a distinguiu, para esses
efeitos, da pessoa física. (TJDF – EIAC 31.941-DF – (Reg. Ac. 78.369) – 2ª C –
Rel. Des. Valter Xavier – DJU 06.09.1995).
Sob esse aspecto, merece especial destaque a Súmula n. 277
do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que é categórica quanto a essa
possibilidade e está redigida nos seguintes termos: “STJ Súmula nº 227 -
08/09/1999 - DJ 20.10.1999 - Pessoa Jurídica - Dano Moral. A pessoa jurídica
pode sofrer dano moral”.
A Justiça do Trabalho, por sua vez, já tem manifestado
entendimento nesse mesmo sentido.
"Por certo que a pessoa jurídica também pode ter
interesses não patrimoniais a serem defendidos e por isso é sujeito do dano
moral. Porém, no presente caso, não restou efetivamente comprovado qualquer
dano moral, mas mero exercício de direito por parte do empregado, mormente
considerando "que as afirmações da inicial não têm o condão de prejudicar
a reconvinte perante terceiros", como bem salientado pelo Juízo a
quo" (TRT/SP, 12ª Turma, ACÓRDÃO Nº: 20081026409, Juiz Relator: MARIA JOSÉ
BIGHETTI ORDOÑO REBELLO, Data da publicação: 12-12-2008).
"Dano moral. Pessoa jurídica. Configuração. Ausência. O
dano moral, para a pessoa jurídica, não é exatamente o mesmo que se pode
imputar à pessoa natural. Só a pessoa natural, obviamente, tem atributos
biopsíquicos. Por isso, o dano moral para pessoa jurídica é o que envolve a
imagem, o bom nome, a fama, a reputação, que são bens que integram o seu
patrimônio. Hipótese em que não há prova do dano. Recurso do reconvindo a que
se dá provimento" (TRT/SP, 11ª Turma, ACÓRDÃO Nº: 20101107956 , Juiz
Relator: EDUARDO DE AZEVEDO SILVA, Data da publicação: 11-11-2010).
"A pessoa jurídica pode sofrer dano moral, inteligência
da Súmula n. 227 do E. STJ. No caso sob exame, não restou comprovada a culpa do
réu, a autora não se desincumbiu do ônus da prova. E no que tange ao dano, não
vieram aos autos as provas concernentes aos prejuízos que oneraram a autora;
mais que isso, os danos relatados no feito, de pequena monta, não têm o condão
de merecer tutela jurisdicional para reparar o aventado dano moral. Não há
qualquer indício de prova nos autos, que demonstre ter atingido o bom nome, da
autora, ou sua boa fama e imagem, em decorrência do agir do réu. Não cabe
reforma" (TRT/SP, 10ª Turma, ACÓRDÃO Nº: 20090670366 , Data da publicação:
08-09-2009, Juiz Relator: MARTA CASADEI MOMEZZO).
Portanto, nota-se que a jurisprudência já aceita com
tranquilidade a possibilidade de configuração do dano moral às pessoas
jurídicas, ainda que com adaptações e adequações que se fazem necessárias. Esse
entendimento é correto e deve ser cada vez mais utilizado, pois constitui um
acervo jurídico importante para a proteção da integridade moral e da honra
objetiva tanto dos indivíduos, quanto das empresas.
Marcelo C. Mascaro Nascimento- Advogado
Fonte: Mascaro Nascimento Advocacia Trabalhista